O Último Cigarro
As mãos fraquejavam, tremiam e ele tateava o interior da caixa buscando o velho fósforo de cartela. Guardara-o por 60 anos, desde sua lua-de-mel. Usara apenas um dos palitos. Ofegante, abriu a gaveta do criado mudo e encontrou atrás da bíblia o maço de cigarros que roubara do enfermeiro no dia da internação. Com alguma dificuldade, contando com a ajuda do ar parado do quarto, conseguiu acender um cigarro na primeira tentativa. Se sua mulher pudesse vê-lo agora... Ela certamente se transformaria em uma onça. Talvez o agredisse com tapas, com socos, com palavras. Chamaria todos os enfermeiros e médicos daquele hospital. Ligaria para os filhos e netos. E quando finalmente conseguisse a atenção de todos, choraria muito. E como era linda quando chorava! Ele sempre dizia que queria morrer primeiro para vê-la chorar em seu enterro. Que bobagem!
Uma crise de tosse violenta. Seu corpo pulava em cima da cama descontrolado. A caixa de sapato jazia no chão. De repente, a calma. E os bipes daquela máquina maldita deram lugar a um interminável apito anunciando o esperado fim.
1 comment:
..E chega a tão esperada e não desejada morte. Essa deve até ser desejada quando já não há mais esperança.
Não sou a pessoa ideal pra falar de morte.
Pra mim ela não passa de uma cretina covarde que me ronda, me cerca, me sonda e me ameaça mas sem a mínima coragem de me matar.
lv u
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