29.3.09

Tangible Non-existence

The further I get,
The more I think.
The closer I am,
The more I feel.

There's something here
Still can't tell what
But I know I'm not alone
The clues, yet powerful, 
Are sometimes misleading

Some get scared
They say I should run
But I won't
Intuition tells me
I must stick around

23.3.09

Brilha Nos Olhos de Quem Vê

A realidade do diamante
A concretude do falso brilhante
Ora, existe a mesma verdade aqui
Quanto a evidente presença dali?

A pedra bruta mal trabalhada
Desarmonia no excesso ou na falta
Humilde vidro, valor: quase nada
Atenção, o cuidado, arte tão alta!

Às vezes me encanto, mera ilusão
Me engano, me enebria, me entrego
Com freqüência teimo, aceito, não nego

Mas sei, surpreso, incomum perfeição
O vidro ao qual raramente me apego
Única beleza que agora enxergo

22.3.09

Breathless



No silêncio vespertino do estacionamento, o fechar da porta do carro soou como retórica: nunca mais. Ele se foi e ela não pôde impedir. Os momentos de paixão que há pouco tinham sido tão intensos, agora pareciam ter acontecido anos atrás. Ele se foi sem precisar dizer que estava indo; ela soube pelo seu olhar. O mesmo olhar que lhe era direcionado antes com admiração, resolveu seguir em frente. Ela soube o por quê. Não podia mais lhe oferecer um coração dividido; ele pedia a eternidade, ela, por ora, lhe oferecia instantes. Ele se foi e ela sabia que havia falhado. Tinha fraquejado e, como havia aprendido em seus poucos mas longos anos de vida, fraquejar significava perder. Ele se foi e ela, por um breve momento, se sentiu realmente roxa, sem ar, sem poder respirar. Não entendeu como vinha respirando por tanto tempo, e agora, perdia o fôlego. Pensou em recuperar o corpo dele, mas já era tarde demais. Esperou, então, pelo cair da noite, onde, quem sabe, suas almas poderiam se reencontrar.



(contribuição especial de uma anônima)

21.3.09

Resolutividade

Ele se decidiu: 
“Chega!” 
Não dava mais. 
Marcaram de se encontrar 
E ela: 
“Assim você não é real.”   

Ela não enxergava 
Ele estava cego 
Seus olhos 
Seu corpo 
Sua alma 
Dela   

“Eu te entendo” 
Ela disse 
Ele suspirou 
“Cala a boca 
E me beija!”

13.3.09

O Último Cigarro

Deitado, respirava com dificuldade. Suas mãos agarradas àquela caixa de sapato. Sabia que não escaparia dessa e agora já nem se preocupava mais. Afinal, não restara ninguém. Tudo o que sobrara de todos aqueles que importavam estava naquela velha caixa de sapato. As fotos, as cartas... As cartas! Havia mais de 20 anos que não recebia uma carta. O envelope chegando com seu nome escrito à caneta. Não era necessário ler o remetente para saber quem o enviara. Costumava sentir seu peso, cheirá-lo e então guardá-lo. Abrir o envelope merecia toda a sua atenção, um acontecimento a ser saboreado. Chegava então do trabalho. Sua mulher terminava de preparar a janta enquanto ele tomava aquele banho frio. Um santo remédio. O havia curado da asma. Maldito cigarro! Bendito cigarro! Se não houvera parado de fumar, não teria sido deixado pra trás com aquele maldito enfisema. Abrir mão daquele prazer... Pra quê?!
As mãos fraquejavam, tremiam e ele tateava o interior da caixa buscando o velho fósforo de cartela. Guardara-o por 60 anos, desde sua lua-de-mel. Usara apenas um dos palitos. Ofegante, abriu a gaveta do criado mudo e encontrou atrás da bíblia o maço de cigarros que roubara do enfermeiro no dia da internação. Com alguma dificuldade, contando com a ajuda do ar parado do quarto, conseguiu acender um cigarro na primeira tentativa. Se sua mulher pudesse vê-lo agora... Ela certamente se transformaria em uma onça. Talvez o agredisse com tapas, com socos, com palavras. Chamaria todos os enfermeiros e médicos daquele hospital. Ligaria para os filhos e netos. E quando finalmente conseguisse a atenção de todos, choraria muito. E como era linda quando chorava! Ele sempre dizia que queria morrer primeiro para vê-la chorar em seu enterro. Que bobagem!
Uma crise de tosse violenta. Seu corpo pulava em cima da cama descontrolado. A caixa de sapato jazia no chão. De repente, a calma. E os bipes daquela máquina maldita deram lugar a um interminável apito anunciando o esperado fim.
Silêncio

Palavras escondidas
Não há versos, não há rimas
A voz tão recolhida
Não há termo que exprima

O folêgo que já me falta
Seus olhos, onde eu parei
No céu, a lua alta
Sua boca, que eu não beijei

Entre um minuto ao seu lado ou viver?
Não há dúvida
Por mais curto que seja o presente 
O sabor é único se estou com você

12.3.09

A Última Vez

Me lembro da última vez. Você saiu do banho naquele seu roupão laranja com uma toalha enrolada na cabeça. Sorria e me pedia calma: “Primeiro, quero secar o cabelo”. Eu estava deitado na cama. Te observava. Não dizia nada. Você nunca secou o cabelo na sua vida.
Desenrolou a toalha devagarinho e começou a puxar as mechas de cabelo entre o tecido, ora esfregando, ora dando tapinhas. Eu te chamava. Você nem olhava pra mim. Só sorria e me mandava esperar. Enrolou de novo a cabeça com a toalha e, percebendo que eu me mexia, parou ao pé da cama e colocou as mãos na cintura.
O roupão entreaberto revelava seus segredos mais perfeitos. Recostei-me na cabeceira da cama. Você se sentou ao meu lado. Olhou pra mim e me beijou devagar. Não me abraçava. Mantinha suas mãos ao longo de seu corpo. Só sua boca era minha naquele momento. E era o suficiente. Apesar de só os nossos lábios e línguas estarem em contato era como se todo o meu corpo e todo o seu corpo fossem uma coisa só. Talvez os olhos fechados ampliassem essa sensação. De repente senti sua mão por trás do meu pescoço. Puxava meus cabelos. Parou de me beijar e se esticou na cama deitada de costas. Pediu que eu começasse devagar. Sempre usava essa palavra: devagar.
Te observei por alguns segundos. Queria que sua imagem penetrasse minha alma através das minhas retinas. Toquei seus joelhos e você estremeceu. Beijei-os levemente, explorando-os e indo lentamente para a parte de trás de suas pernas. Agora usava vigor, com a boca entreaberta, permitindo minha língua escapar aqui e ali. Subia lentamente pela parte interna de suas coxas. O cheiro, o gosto, a textura da sua pele, tudo me fazia querer morrer naquele instante. Queria levar desse planeta só aquilo. Subia mais e ouvia sua respiração, agora mais profunda. Quando alcancei sua virilha, suas mãos seguravam minha cabeça. Parei de usar os lábios. Troquei o toque da minha pele por assopradas leves. Até que não resisti mais e deixei minha língua penetrar enquanto minhas mãos se divertiam passeando por toda parte do seu corpo a seu alcance.
É difícil descrever o que acontecia nessas horas. Mas me lembro que à certa altura você sempre me interrompia e, entre gemidos, dizia: “Agora!”

Racional

Minha cama é agora a razão
Se não faço o que fazia
Se não canto o que cantava
É só por que o mundo
Não pode parar de rodar

Calei todas as vozes sem som
Não sinto o que não se sente
Não vejo mais o que não se vê
(E se vejo, agora escolho fechar os olhos)

Não tem mais impulso
Nem desejo, nem capricho
Não tem mimo, não tem dengo

Não tem mais carpe diem
Nem busco sentido pra vida
Não tem mais filosofia estéril

Tomei minha vacina
Vou servir a pátria amada
O orgulho da família

Funcionário do mês
Uniforme bem passado
E um sorriso na parede

A nobre literatura morreu
Pra nascer o que é direito
Só tenho bom senso
E não sinto mais nada

Pra que minha vida siga adiante

Árido

No final do outono e no começo do inverno
Tudo é cinza, tudo é morte
Não existe movimento
A vida se reduz
Menos que um sopro

A terra não tem outra alternativa
Se agarra às últimas gotículas
E espera

6.3.09

Your House

Com a chave na fechadura ela começou a rezar. Ele costumava ficar em casa até mais tarde depois do almoço nas segundas. Mas isso era antes. Os hábitos haviam mudado.
Destrancou a porta e entrou soltando o ar pesado que carregava nos pulmões. Deixou cair a bolsa no chão da sala como tantas outras vezes. Não. Agora era completamente diferente. Subiu a escada que dava para o quarto. A cama de casal estava impecavelmente arrumada. Não resistiu, deitou-se nela.
Sentia o cheiro dele. Abriu o guarda-roupa e se sentiu engolida por tudo. Foi até o banheiro e se despiu -- sem se preocupar onde as peças que usava caíam. Entrou no chuveiro e deixou a água cair sobre seu corpo trêmulo de soluços. Sentia o chão frio em suas nádegas e a água quente em suas costas desprotegidas. Saiu do chuveiro e vestiu-se com o roupão dele. No armário do banheiro, o vidrinho de perfume a torturava.
Desceu as escadas novamente e foi até o escritório. Acendeu um incenso. Vasculhava os CDs. Sabia que nenhum daqueles eram seus. Eram todos dele. E viu um pedaço de papel sobre a mesa. Era uma carta de amor. Mas não era sua letra. Nem mesmo saberia dizer de quem era aquela letra que falava todas as coisas que ela um dia dissera.
Finalmente, vestiu novamente suas roupas e foi embora, deixando para trás as chaves do apartamento, a porta destrancada e um pedido de desculpas.

1.3.09

Névoa   

Primeiro, seus olhos 
Não! Seu sorriso 
Depois, sim, o olhar 
Uma lagoa 
Pra eu entrar, mergulhar 
Não tem jeito de chegar perto 
Tudo a sua volta é barreira 
Tudo a sua volta é repulsa 
Mas eu insisto 
Te cerco 
Por todos os lados 
E se me machuco 
Não me importo 
Se mais gente se fere 
Tarde demais
Pra ter você 
Até o errado é certo 

De repente desisto 
E você me chama 
Com essas palavras que eu não entendo 
Seus gestos dúbios 
Quer me agredir 
Ou vai me abraçar?   

E está em meus braços 
Enlevo 
Você se desfaz 
Névoa 
E me distraio 
Te vejo mais uma vez 
E agora minha língua 
Sua língua 
Meu corpo e seu corpo 
Contorcidos e entrelaçados 
Não há ar suficiente pra nós dois 
Suas mãos me procuram 
Minha boca quer beber tudo   

Mas você é névoa 
Se desfaz

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Reincidência  

Ela já foi e voltou 
Nem sei mais há quanto tempo 
Nem sei quantas vezes   

Mas é sempre a mesma coisa 
Ela se insinua, se mostra 
Começa devagar 
Às vezes nem tanto   

Seus lábios, seus olhos 
Suas mãos e sua voz 
Agarram minha alma 
Se apossam do meu corpo   

A príncipio não me convence 
Me defendo, me esquivo 
E então estou novamente 
Entregue e vulnerável
 
E ela se dissipa, se despedaça 
Vidro ou cristal?

TPM Masculina

Entraram no carro dela. O dele estava na revisão. Assim que ela girou a chave e as luzes do painel se acenderam, ele deu uma olhada no visor de cristal líquido: 
-- Caralho! 
-- Que foi? 
-- Eu não vi que tava atrasado. 
-- Cê não tá atrasado. Faltam 30 minutos. 
-- Normalmente eu já estaria no trabalho. 
-- Mas hoje não é normalmente. 
Ela engatou a ré e o carro começou a se mover. Ele levantou o joelho bruscamente e se agarrou ao painel. Ela respirou fundo. 
-- Que caminho é esse? 
-- O caminho certo. – ela respondeu sem olhar para o lado. 
-- Se você fosse por cima escaparia do trânsito. 
-- Mas a volta seria tão grande que eu gastaria o mesmo tempo. 
Ele resolveu ligar o som, mas não encontrou nenhum de seus CDs. Mudou para rádio e viu que nenhuma de suas estações estava programada na memória. Resolveu voltar a atenção ao trânsito novamente. 
-- Ué, essa avenida não é a Ricardo Jaffet? 
-- É. Mas aqui ela tem outro nome. E lá na frente ela vira Imigrantes. 
-- Não sei pra quê tanto nome. Coisa imbecil. 
-- Se seu pau fosse grande, cê também poderia colocar vários nomes nele. 
-- Dirige, tá? Era só o que me faltava. Eu tô atrasado, a porra da avenida tem três nomes, o farol tá vermelho e eu ainda tenho que ouvir minha mulher dizer que meu pau é pequeno. 
-- Eu não disse que ele é pequeno. Só não é grande. E agora você sabe como eu me sinto na TPM. É isso que cê tá sentindo agora. Ininterruptamente.

She Wears Purple

No, there hasn’t been a smile like that
And no eyes have been brighter
The way you tilt your head to get attention
Or throw you hands in front of me
Clumsy and beautiful

And why do you read me like you do?
You understand the languages I speak
And also the ones I want to learn
You listen to my songs
You know the words by heart
(I thought they were mine
But it seems I’m yours)

And as if all that wasn’t enough
There’s your white skin
The soft flesh around your bones
The delicate touch of your body when I hold you

And then you leave
An empty bottle of wine in my hands