27.7.11

Vida de Entrega

Vida de Entrega

O bichinho foi pego indefeso pelo rabo e suspendido, apartado de seus irmãozinhos gêmeos. Somavam 25 ao todo. Não mais. Agora eram 24. E ele era apenas um. O primeiro deles condenado à morte, ainda que uma morte incerta. Não que sua vida fosse muito excitante: passava, e passara, todos os dias de sua vida em um recipiente de plástico branco, forrado com serragem, que mal continha ele e seus 24 irmãos. Era bem verdade que não podia reclamar de falta de recursos: havia sempre água fresca e comida mais que suficiente para toda a família, ainda que a água tivesse que ser acessada por um de cada vez. A água era trazida por um tubo metálico que penetrava o recipiente que tinham por lar. Além de recursos, ainda que o espaço fosse pouco, era possível se exercitar. Em realidade, era necessário certo exercício para se alimentar e para ter acesso à água. Os pequenos se agarravam à grade que encerrava a parte de cima de sua residência. Os mais habilidosos (e ousados!) usavam apenas as patinhas dianteiras para tal. Observá-los se alimentarem era como um número do Cirque du Soleil em miniatura. Mas para ele, tudo se encerrava ali. Sentia a pele de suas costas e seu rabo presos de maneira que não podia fazer nada, a não ser emitir seus guinchinhos desesperados. A agulha, de espessura muito maior que qualquer um de seus dentes, penetrou a pele de seu abdome e peritôneo, infundindo em seu pequeno corpinho algo que ele agradecia não saber o que era. Em seguida, ele foi colocado em um recipiente menor, porém muito parecido com aquele no qual vivera até aquele dia. Água e comida lhe era ofertada da mesma maneira. Só que agora com exclusividade. Mas não tinha fome, nem sede. Sentia apenas medo. O que aconteceria em seguida? Sentiria dor? Ou simplesmente morreria em seu sono, com tranquilidade? Era impossível prever. E revisitar as histórias que ouvira durante toda sua vida só o torturava mais. Resolveu tentar se acalmar e dormir um pouco. Não restava mais nada a fazer além de esperar. Tudo pela ciência.

2 comments:

Guilherme Navarro said...

Até eu que não sou dos mais sensíveis fiquei meio tocado, parabéns Bruno, excelente, como sempre!

Anonymous said...

Só pode ser históri dos seus ratinhos, né?

Bjinhos pra vocês